Comprimidos

Leia a bula.

Ao persistirem os sintomas, procure um médico que saiba responder algo além de "deve ser amor".
Que coisa doentia.

quinta-feira, julho 29, 2010

No escuro...

As luzes se apagaram e os sentidos ferviam intimamente. Ele sorria na escuridão; ela tinha medo. Qualquer toque seria uma descarga energética no corpo juvenil da menina. Ele estava preparado, era experiente. A mãe dela, superprotetora, nunca deixou que a menina se arriscasse, mas dessa vez uma viagem interrompeu os cuidados. A curiosidade afogou o receio maternal e aqui estava ela, pronta pra embarcar numa nova situação. Mas as expectativas eram diferentes. Para ele seria apenas mais uma vez. Para ela, sentimentos envolvem o jogo. A liberdade.
Começou. Ele tateando a escuridão e a menina, acanhada, se sente enclausurada, quente e perdida.
Ele está chegando cada vez mais perto, o que permite que a jovem sinta o ar quente que sai dos lábios do rapaz, bem como o cheiro de menta que invade o quarto. Um breu perfumado, bêbado com o cheiro das carnes frescas.
Um deslize e ele a toca. O choque. Uma risada.




- Te peguei! Tá com você agora!

domingo, julho 25, 2010

Happiness.

Ser feliz é mais do que um rosto sorridente,
Mais do que ter tudo na sua frente.
É poder se dizer inteiro
E fazê-lo sem motivo ou condição.
Felicidade não é algo que se encontra em cantos,
Mas o que se perde em contos, lembranças
E que por eles fica.
Capaz de isolar mentes
E levá-las pra outro plano, corpo ou pensamento.
Mais do que existir, ela nos permite ser.
Utópica, é a maxima da vida,
Ladra de almas e criadora de ilusões,
Onde está você, felicidade bandida?
Com suas milhões de infinitas versões,

É tudo que quiser e puder.
Abstrata, criação de nós mesmos.
Identidade do espírito.
Felicidade é mais do que um conceito ou sensação,
É a ideologia do coração.

Concordo com esse meu 'eu' de algum tempo atrás quando dizia que felicidade é invenção de nós mesmos, mas isso não anula a minha dependência dos outros pra ser _feliz_. Sim, porque são eles (ou vocês) que me impulsionam, que me são guia para minhas buscas, que projetam novos anseios, sonhos e tentações. Sem 'os outros', eu não seria eu. Minha formação seria outra. Eu teria outro formato. Ou nem o teria. Seria só um corpo a perambular, sem gosto, cheiro.
Sem ter com quem usar meu tato, olfato, paladar.
Sem fazer sentido.
Sem visão de mundo.
Um breu, um caos, um fim.
Mas vem ela. A luz que cega até a escuridão. Que é requisitada por toda e qualquer alma vivente. Sonho, pesadelo e insônia de consumo. Não pode ser consumida. Não tem validade, prazo ou termos de condição. Não vem com bula mas é remédio pra qualquer dor. O cientificismo se perde e é o romântico que se esbalda nesse mar de felicidade.
O único em que eu me afogaria com os lábios escancarados de sinceridade e os dentes mostrando que, enfim, tudo valeu a pena.

sábado, julho 24, 2010

The evening of the day.

Há quem diga que noite escuras remetem a solidão, melancolia. Também há aqueles que vivem das saídas no mais tardar das horas, querendo se perder por aí e depois colocar a culpa no breu. Mas, pra mim, a noite é dia. Tem cor, graça, cheiro de céu, gosto estrelado e uma luz tão forte como a solar. Lunado, ela faz de mim uma criança à beira da janela, contando pontinhos infindos e esperando que eles conversem comigo.
Mas não falam. Somente brilham e encantam.
Ganho minhas horas observando o caminhar das nuvens, sinuosas e carregadas pelo sopro dos céus. Uma respiração inconstante e fantasmagórica. As cortinas não se fecham, mas os olhos dão sinais de que estão cansados. Pesados, eles se calam. Seus gritos diante da obra infinita emudecem e, assim, preciso voltar pro meu canto e deixar a viagem lunática.
Afago o travesseiro, sinto o cheiro da manhã que virá e durmo.

Há quem diga que o dia ensolarado é bom pra quem não tem rotina. Também há aqueles que ficam putos por não ter como aproveitar a chance, e perdem seu tempo reclamando de suas próprias escolhas. Mas, pra mim, dia é noite. Tem sabor de esperança, tintura de imensidão e sua temperatura é capaz de manter quente o mais gelado dos corações. Ele me abraça com a natureza, envolve meus braços com o pôr-do-sol e me protege, projetando minha sombra aonde quer que vá pra que não me sinta só.

Aos tais "d'aqueles que dizem", o dia não tem humor, então não o culpe por suas frustrações ou problemas. Não foi a noite quem disse adeus pra quem não devia e agora se rói por arrependimentos. As horas não merecem ser julgadas pelo seu ócio ou atordoações, bem como o tempo não é reflexo das suas necessidades. A lei de Murphy não foi capaz de domar a natureza, o que significa que a chuva não cai porque você tem planos ensolarados. Ela simplesmente cai, e não deixaria de fazê-lo se você tivesse comprado o mais bonito dos guarda-chuvas.

A madrugada não é feita para apenas dormir, sair ou assaltar a geladeira. É feita pra viver e dar um descanso pra noite que se foi e pra manhã que está por vir. Feita para nos afogarmos nas pelúcias, enquanto extraimos as mágoas e exasperações. Pra ligar pros amigos, familiares, amores e desconhecidos. Conhecê-los e fazer deles parte da sua agenda telefônica, da cartilha do coração. Pra sorrirmos sozinhos, sem motivo nem perguntas. Ou para, simplesmente, existirmos.


Se souber aproveitar cada instante, o dia beija a noite num relance e tudo pode acontecer. Por isso, não me preocupo com o que o relógio marca; está sempre na hora.

sexta-feira, julho 23, 2010

Sans frontières.

Para muitos um motivo para esquecer,
Para nós a causa de tamanha vontade de se ver.
Saudade que invade
E traz sempre aquela lembrança calma.
Memória que me aquece a alma.
Que nutre meus pensamentos.
Que não me deixa voar sem estar contigo.

A distância é algo inexistente
Como o tempo;
Por mais que nós o usemos,
Não há como contá-lo nem como pará-lo,
Assim como esse espaço que nos separa e, ao mesmo tempo,
Faz-nos amar.

Uma distância que separa corpos,
Mas não sentimentos.
Que limita carícias,
Mas eterniza momentos.
Uma distância vulgar,
Mas que segue-se suntuosa pela capacidade de atrelar nossos anseios.

Uma distância que completa o imperfeito
Uma extensão de limites, fronteiras, e sonhos.

quinta-feira, julho 22, 2010

Lire de lui-même.

Às vezes, inventamos maneiras pra dizer sempre "não" por ter medo do "sim".
No entanto, o que agora me afronta não é a afirmação, mas o início do fim.

Pode parecer conformismo ou uma espécie de masoquismo adaptativo, mas internamente o vejo como um mecanismo de defesa, de proteção. Por mais que a situação não esteja perfeita, é mais seguro se manter nela até que algo concreto apareça e me tome nos braços, me tirando dessa prisão. Uma enrascada de sentimentos, que assola todas as partes do meu corpo. Que prende minhas mãos junto ao peito e a mente atada às falanges desesperadas. Tudo treme.
Tremor. Amor. Que seja.
Está bem, não é amor. Nunca foi, espero que não tente ser.
Faz falta, incomoda, subordina e limita, mas não me cega, felizmente.
Só estou nessa por medo, reconheço. Já cometi esse erro uma vez.
Estava segura, arrisquei, perdi tudo.
O tal do certo pelo maldito duvidoso.
Mas não arrisquei relações, amizades, contratos, números, matéria.
Pus a perder meu eu.
Aquele que gritava por alguém que é surdo, que chorava por um coração duro e pedia respostas de uma alma muda.
Aquele que planejava discursos poéticos, com o propósito de tornar tudo o mais próximo das histórias infantis. Pena que não há mocinhos. Nem sempre o final feliz é garantido.
Pelo menos não na mesma história.

Me disponho, então, a mudar de livro. Escrevê-lo com cautela, mas sem temer as páginas seguintes. O enredo se dará de acordo com as linhas tortas que irei preencher. A caligrafia mais polipolar, as lacunas, os garranchos apressados. Os capítulos pulados, apagados ou repetidos pra afirmar tudo que representaram. O clímax.
Autora naturalmente desenfreada que acaba estagnando por um simples embate de idéias. Uma crítica, uma distração. Uma tirinha ou passatempo, pode-se dizer.
Mas não estou mais pra brincadeiras, palavras cruzadas ou contadas no fim do livro. Não quero algo com três cenas, frases de acaso ou um fim escusado.
Não quero uma série. Quero um enelogia sem fim.

E não mais temo porque o início do fim sou eu quem dita. Minhas ações transcritas no rascunho da vida não se apagam com o tempo, nem mesmo se acumularem poeira na estante da memória.
Não há editora, publicação em larga escala ou selo de comprovação. Não merece prêmio Nobel ou fãs histéricas. São algumas muitas páginas, que transpiram sentimentos e valores. Que absorvem minhas lágrimas e fotografam os sorrisos. Que não podem ser amassadas ou rasgadas pois tem o dom de ressurgir. Aliás, nunca somem. É impossível não lembrar do que nunca se esqueceu.
E mesmo que se esqueça, a história é imutável e didática. Aprender com cada fala e episódio dessa bíblia passional é missão de sobrevivência. Páginas que, no fim de tudo, vão refletir quem fui e quis ser, o que pude, quis e sonhei em fazer. Os anseios de uma leitora de si própria.
São só algumas páginas.
É só a minha vida.

Como se fosse pouco.